Animais circulam livremente desde as primeiras horas da manhã; risco à segurança de motoristas e pedestres mobiliza autoridades. Caso evidencia falhas estruturais na fiscalização urbana e na responsabilidade dos proprietários.
Miraí (MG), 27 de junho de 2025 – A circulação de cavalos soltos na Praça Central de Miraí, município localizado na Zona da Mata de Minas Gerais, provocou preocupação e mobilização dos órgãos de segurança pública e da população local na manhã desta sexta-feira (27). Os animais foram vistos no centro urbano a partir das 7h30, em meio à movimentação intensa de veículos e pedestres, sem qualquer sinal da presença dos proprietários.
O episódio gerou riscos imediatos à segurança viária, uma vez que a praça é uma das principais vias de circulação da cidade. A presença dos animais obrigou condutores a redobrarem a atenção, especialmente durante o horário de pico. A Polícia Militar, a Defesa Civil e o setor de fiscalização da prefeitura foram acionados, mas, até o fechamento desta reportagem, os responsáveis pelos animais não haviam sido localizados.
Riscos Imediatos e Impactos Urbanos
A circulação de animais de grande porte em áreas urbanas não é um fenômeno isolado. Especialistas alertam que além de representar risco direto à integridade física de motoristas, motociclistas, ciclistas e pedestres, também gera impactos econômicos e administrativos para o município.
“O risco de um acidente envolvendo um animal desse porte é enorme. Uma colisão pode resultar não só em danos materiais, mas também em ferimentos graves ou até mortes”, explica o especialista em mobilidade urbana e segurança viária, Dr. Rogério Almeida. Segundo ele, a negligência dos donos e a fragilidade na fiscalização criam um ambiente propício para ocorrências desse tipo.
Dados do Instituto de Segurança no Trânsito (IST) apontam que, só em Minas Gerais, acidentes envolvendo animais nas vias públicas aumentaram 12% entre 2023 e 2024, com destaque para municípios de médio e pequeno porte, onde a urbanização avança sobre áreas tradicionalmente rurais, mas a regulação e a fiscalização não acompanham esse processo.
Cenário Nacional e Comparações Internacionais
O problema não é exclusivo de Miraí, nem do Brasil. Países como Argentina, Colômbia, Índia e regiões rurais dos Estados Unidos lidam frequentemente com ocorrências similares. Na Índia, por exemplo, a presença de vacas e outros animais em centros urbanos é tratada como questão de saúde pública e de planejamento urbano. Já nos Estados Unidos, sobretudo em estados como Texas e Kentucky, leis estaduais determinam pesadas multas e até responsabilização criminal para proprietários que deixam animais soltos em áreas públicas.
No Brasil, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), no artigo 269, estabelece que a circulação de animais em vias públicas sem controle é infração, sujeita à apreensão do animal, multa e responsabilização civil e criminal do dono, especialmente em caso de acidentes.
Desafio Estrutural e Governança Local
O episódio evidencia um problema estrutural enfrentado por pequenos municípios: a dificuldade em manter fiscalização eficiente, a escassez de recursos para captura e abrigo de animais de grande porte e, sobretudo, a cultura de negligência de alguns proprietários, que subestimam os riscos que essa prática oferece.
Fontes da administração municipal informaram à Rádio 99 Play que não há um espaço específico estruturado para recolher e manter cavalos apreendidos. “Hoje, quando ocorre uma situação dessas, a prefeitura precisa mobilizar recursos emergenciais. Nem sempre temos caminhões apropriados, nem local adequado, o que dificulta a resposta rápida”, informou um agente da Defesa Civil, sob condição de anonimato.
Além dos riscos imediatos, há repercussões jurídicas. A legislação brasileira responsabiliza diretamente o proprietário por qualquer dano causado pelo animal. Em casos onde ocorrem acidentes com vítimas fatais, os proprietários podem responder por homicídio culposo — quando não há intenção, mas há negligência.
O advogado especialista em direito civil e urbanístico, Dr. Fábio Castro, explica: “O município pode ser acionado judicialmente se ficar comprovado que houve omissão na fiscalização, mas, prioritariamente, a responsabilidade é do proprietário. É dever de quem cria qualquer animal garantir que ele não ofereça risco à coletividade.”
Além da segurança, há impactos diretos sobre os cofres públicos. A cada mobilização para captura, transporte e eventual cuidado veterinário dos animais, a prefeitura precisa arcar com custos não previstos, comprometendo recursos que poderiam ser destinados a outras áreas essenciais, como saúde e educação.
O comércio local também sente os efeitos. Comerciantes relataram à Rádio 99 Play que os cavalos circularam próximo a estabelecimentos, assustando clientes e, em alguns casos, provocando danos em canteiros e lixeiras.
A Prefeitura de Miraí informou que equipes da Defesa Civil, da Vigilância Sanitária e do setor de Meio Ambiente acompanham a situação desde as primeiras horas da manhã. A administração estuda medidas para endurecer a fiscalização, incluindo a possibilidade de editar um decreto municipal que regulamente com mais rigor a circulação e apreensão de animais em vias públicas.
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) também pode ser acionado para acompanhar o caso, sobretudo se ficar configurada omissão reiterada do poder público ou negligência sistemática por parte dos proprietários.
O caso em Miraí é um retrato fiel de um problema que ultrapassa fronteiras locais. A gestão de espaços urbanos em transformação, o crescimento desordenado e a negligência quanto às responsabilidades individuais e coletivas formam uma equação que ameaça diretamente a segurança pública e a qualidade de vida.
Enquanto os cavalos continuam na praça, a cidade assiste a mais um episódio que expõe os desafios contemporâneos das pequenas cidades brasileiras diante da necessidade urgente de modernizar sua governança, sua infraestrutura e sua legislação urbana.