A escola é um dos principais espaços de desenvolvimento, aprendizagem e construção de vínculos sociais. Depois do ambiente familiar, é o ambiente onde crianças, adolescentes e jovens passam a maior parte do tempo. Isso deveria colocá-la como acolhimento, respeito e identificação. Contudo, essa não é a realidade vivida por todos os estudantes, em especial da população LGBTQIAPN+ (lésbicas, gays, bissexuais, trans, queer, intersexo, assexuais, pansexuais, não binários + outras identidades).
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A “Pesquisa Nacional sobre o Bullying no Ambiente Educacional Brasil 2024”, lançada nesta quarta-feira, 16, retrata a experiência escolar de pessoas LGBTQIAPN+. O levantamento revelou que 86% dos respondentes se sentem inseguros na instituição de ensino que frequentam, devido a alguma característica pessoal.
No recorte entre pessoas trans, esse número é ainda maior: 93% não se sentem protegidos na unidade educacional, sendo que 47% vivenciam essa sensação desde sempre.
Desenvolvida pela Aliança Nacional LGBTI+, Plano CDE e Instituto Unibanco, o estudo ouviu mais de 1.100 estudantes de instituições de ensino de todo o país.
Por um espaço mais inclusivo
“A escola é o primeiro momento no qual a criança vai ter contato com outras realidades, o que gera muitos conflitos por que todos pensam diferente, se vestem de maneiras diferentes, têm religiões diferentes, corpos diferentes. Ainda não existe segurança. Cabe a escola despertar esse senso crítico nas crianças e jovens”, diz Toni Reis, diretor-presidente da Aliança Nacional LGBTI+
Raquel Souza, coordenadora de pesquisa e avaliação do Instituto Unibanco, defende a escola como um local que tem compromisso com o fortalecimento da democracia e da cidadania, orientando seu currículo por valores inclusivos, como reconhecimento e respeito às diversidades.
“O que o levantamento demonstra é que esse ideal de escola está pouco presente na experiência dos participantes da pesquisa – adolescentes e jovens que se reconhecem como LGBTI+. Uma realidade que sinaliza a necessidade de políticas públicas que efetivamente queiram fazer da escola um espaço acolhedor, respeitoso e promotor de direitos”, destaca.
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De acordo com a coordenadora do Instituto Unibanco, o que torna a escola um lugar de insegurança para pessoas LGBTQIAPN+ é a vivência constante de situações de discriminação e violência.
“Os estudantes declaram que faltam à escola recorrentemente, pensam em abandoná-la, mas, ao mesmo tempo, querem ter uma trajetória longeva de escolarização. É alto o percentual de participantes da pesquisa que querem ter diploma de ensino superior. Ou seja, parece que enfrentam um elefante por dia para seguir com esse horizonte de futuro”, ressalta.
Dos participantes da pesquisa, 42% das pessoas cis (aquelas que se identificam com o gênero que lhes foi atribuído ao nascer) declararam já terem considerado abandonar a educação básica, mas esse percentual sobe para 60% quando consideradas exclusivamente as respostas jovens trans.
Diferentes agressões
Os respondentes também apontaram que sofreram agressões no ambiente escolar. Em 2024, 90% dos estudantes enfrentaram algum tipo de agressão verbal e 38% das pessoas trans e travestis alegaram ter sido vítimas de violências físicas no mesmo ano.
Outros colegas são os indicados como principais perpetradores de bullying e lgbtfobia (97%). Por vezes, a agressão também parte parte dos docentes (35%). Integrantes da gestão escolar (16%) e outros profissionais da escola (10%) também foram citados.
Ao falar sobre agressões verbais cometidas por professores, Toni explica que é necessário tratar essa questão de forma sensível e aberta. “O professor precisa se conscientizar de que existem palavras que magoam. Isso precisa ser trabalhado de uma forma tranquila. O educador deve está aberto para receber feedbacks [retornos avaliativos] dos alunos”, diz.
Para Raquel Souza, é preciso, ainda, reconhecer que nenhum tipo de situação de discriminação e violência pode ser tolerada no ambiente escolar e que também professores podem sofrer sanções quando realizam atos que vão contra as regras de convivência e respeito da escola.
“Sobre esse aspecto, parece ser importante que certas situações problemáticas, conflitos e dilemas enfrentados pela escola sejam objeto de reflexão dos e das profissionais e, mais do que isso, apreciados à luz dos princípios que regem a educação e as instituições públicas brasileiras, expressos na nossa Constituição, nas leis e normas educacionais”, completa.
Toni também ressalta a importância do cumprimento da Lei 13.185/2015 que institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) em todo o território nacional. A legislação obriga escolas, clubes e agremiações a adotarem medidas de combate e prevenção ao assédio e à intimidação. “É necessário ter uma equipe de trabalho de conscientização permanente na escola, que vai escutar e acolher estudantes que estão se sentindo oprimidos e discriminados”, explica.
Para o professor, um dos principais entraves do combate ao bullying é a questão, por muitas vezes, não ser levada a sério, encarada por adultos como piada ou brincadeira de criança. “O bullying é um prejuízo na vida das pessoas, principalmente na vida acadêmica do estudante. Um estudante que sofre bullying é uma criança que não vai ter produtividade”, conclui.
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