Se você olhou para o céu de Porto Alegre e outras cidade do Rio Grande do Sul neste sábado provavelmente notou inúmeras linhas brancas cruzando o azul. O que muitos enxergaram como “trilhas de aviões” são, na verdade, contrails — abreviação de condensation trails (ou trilhas de condensação) — um fenômeno atmosférico que ocorre quando aeronaves voam em altitudes elevadas sob condições específicas de temperatura e umidade.
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Mas por que tantas hoje? A explicação é científica — e fascinante. Os motores das aeronaves liberam vapor d’água, dióxido de carbono, monóxido de carbono, enxofre e outras partículas.
A formação das trilhas visíveis ocorre quando o vapor d’água expelido encontra o ar frio e úmido nas altitudes mais altas, geralmente acima dos 8 mil metros.
Nessas camadas da atmosfera, onde as temperaturas giram em torno de -40 °C, o vapor se condensa rapidamente e congela, formando cristais de gelo que se tornam visíveis como longas linhas brancas.
Neste sábado, as condições atmosféricas estão perfeitas para a formação dessas trilhas, destaca o meteorologista da MetSul Luiz Fernando Nachtgall. “A atmosfera sobre o Rio Grande do Sul apresenta alta umidade nas camadas superiores nas altitudes onde voam os aviões e céu quase limpo com pouca turbulência. Isso favorece não só a formação, mas também a persistência das trilhas, que podem ser vistas por longos períodos e em maior número”, observa o nosso meterorologista.
Quanto maior a umidade em altitude, mais tempo essas trilhas permanecem no céu. Quando o ar é seco, elas tendem a evaporar rapidamente. Mas em dias como hoje, os contrails permanecem por horas e podem se espalhar, formando nuvens finas semelhantes a Cirrus.
Nachtigall observa que os dados da sondagem por balão meteorológico de Santa Maria de hoje de manhã (gráfico) mostravam que a umidade era de 10% a 30% entre 1000 e 9000 metros de altitude, mas entre 10000 e 11000 metros, altitude de cruzeiro em que viajam os aviões comerciais, a umidade era de 60% a 70%. A temperatura medida pelo balão a 10.800 era de 45ºC abaixo de zero.
Por isso, com a maior umidade em níveis mais altos, desde ontem se observam nuvens altas do tipo Cirrus formadas por cristais de gelo e que ontem foram responsáveis por um belíssimo fim de tarde em Porto Alegre.
IMAGEM | Entardecer desta sexta-feira em Porto Alegre visto da sede do @mp_rs com as nuvens altas do tipo Cirrus realçando as cores do fim de tarde. 📷 @cid_martins, Gregóri Bertó e Thiago Coutinho pic.twitter.com/DkVc2hJ16K
— MetSul.com (@metsul) July 4, 2025
Além disso, Porto Alegre e outras cidades gaúchas estão sob rotas aéreas comerciais intensas, ligando o Sudeste e a Europa aos aeroportos do Cone Sul como Ezeiza e Carrasco, e essa movimentação contribui para o acúmulo de trilhas.
Estudos indicam que o setor de aviação é responsável por cerca de 3,5% das emissões globais de dióxido de carbono oriundas da atividade humana. Aviões modernos ajudam a mitigar esse impacto, emitindo até 20% menos CO₂ que modelos antigos, mas o crescimento da aviação mantém o tema em debate.
E quanto às teorias da conspiração? As famosas chemtrails — uma teoria que afirma que governos ou organizações estariam espalhando substâncias químicas deliberadamente pelos céus — não têm respaldo científico.
A teoria da conspiração dos “chemtrails”, também conhecida como “smart dust”, garante que os rastros brancos deixados no céu por aviões contêm produtos químicos tóxicos que são lançados no ar com vários propósitos secretos: esterilização, controle da mente, redução da população ou controle do clima.
O Grupo Keith, da Universidade de Harvard, dedicado à pesquisa em ciência do clima, tecnologia e geoengenharia, publicou um artigo sobre essa teoria, concluindo que ela é infundada e que a implantação de um programa em larga escala não poderia ser sigilosa.
Em setembro de 2000, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos Estados Unidos, a Administração Federal de Aviação (FAA) dos Estados Undos, a Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (NASA) e a Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA) divulgaram uma declaração em resposta a “múltiplos pedidos” recebidos sobre este assunto.
Nela, afastam a teoria de conspiração e detalham como são formados esses rastros, “nuvens em forma de linha compostas de partículas congeladas”, e em que condições eles permanecem no céu por mais ou menos tempo. Embora reconheçam seu impacto negativo na atmosfera, eles observam que “não representam uma ameaça direta à saúde pública” e que “evaporam quando as condições atmosféricas locais ficam secas o suficiente” para permitir isso.
Portanto, o céu riscado hoje é resultado de um alinhamento entre atmosfera propícia, tráfego aéreo intenso e curiosidade natural. Da próxima vez que sair para uma caminhada olhe para cima: o espetáculo pode estar logo acima de você.
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